Com o advento do Novo Código de Processo Civil houve uma significativa inovação na cobrança judicial das cotas condominiais inadimplidas.
O revogado Código de Processo Civil de 1973, em seu artigo 275, II estabelecia que o débito condominial deveria ser cobrado judicialmente através de um processo de conhecimento, utilizando-se do procedimento sumário.
Contudo, durante os mais de 40 anos de vigência do CPC/73 a grande maioria dos magistrados de primeiro grau passou a converter o rito das ações de cobrança ajuizadas pelo procedimento sumário, as quais passaram a fluir sob o rito ordinário, de forma que isto não acarretava nenhum prejuízo às partes litigantes, haja vista que o procedimento sumário não atingira mais o objetivo previsto pelo legislador.
O rito sumário não importava em celeridade ao processo, onde haveria a citação do Réu a comparecer a uma audiência de conciliação (art. 277 do CPC/73), para nesta oportunidade apresentar defesa. Contudo, por dificuldades de adequação de pauta e em virtude do número excessivo de processos em andamento perante o judiciário, por vezes transcorria mais de seis meses entre o ajuizamento da demanda e a data da audiência designada.
O Novo Código de Processo Civil, trouxe um avanço e uma inovação louvável ao introduzir no rol dos títulos executivos extrajudiciais, insculpido no artigo 784, incisos VIII e X, o crédito condominial documentalmente comprovado.
Desta forma, o credor tem a possibilidade de encurtar a fase de conhecimento para atingir a satisfação de seu crédito, de forma que a prestação jurisdicional seja entregue em tempo razoável ao jurisdicionado, e o Estado não compartilhasse da demora excessiva a qual a entidade condominial era vitimada.
Vale consignar, que a taxa condominial é uma obrigação de trato sucessivo – também denominada de continuada ou periódica – eis que a obrigação se prolonga no tempo e a cada novo período surge uma nova obrigação, sem que seja extinta a anterior, a qual será renovada em sucessivas prestações singulares, enquanto perdurar a relação jurídica entre as partes.
Assim, o artigo 323 do CPC/15[1], que encontrava disposição semelhante no Código de Processo Civil de 1973 em seu artigo 290, dispõe que: “Na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las.”
Referido dispositivo encontra-se sistematicamente localizado dentro do livro I da Parte Especial do Novo CPC, sendo que o artigo 771, parágrafo único do CPC, que é o primeiro artigo do livro II do NCPC, que disciplina o processo de execução prevê de forma clara, objetiva, inequívoca e precisa que “aplicam-se subsidiariamente à execução as disposições do livro i parte especial.” (grifou-se)
Ora, se o artigo 771, parágrafo único determina que se aplicará subsidiariamente ao Processo de Execução as disposições do Livro I da Parte Especial, e o artigo 323 está localizado dentro do Livro I da Parte Especial do Código de Processo Civil de 2015, a conclusão que se permite chegar é que o artigo 323 se aplica ao processo de execução.
Porém, o requisito básico para que um débito possa ser cobrado em juízo através da execução de título extrajudicial (ou execução por quantia certa, como denomina o NCPC), nos termos do artigo 803, I do CPC, o título executivo deve ser líquido, certo e exigível.
Por um manifesto equívoco legislativo, que poderia muito bem ter sido disciplinado de forma clara e objetiva dentro do próprio livro do processo de execução, o qual incluiria dentro do “quantum debeatur” as taxas condominiais que se vencerem no curso do processo, fica esta dúvida que vem gerando discussão perante os operadores do direito, de forma que se permite suscitar um conflito de normas existente entre os artigos 323 e 803, I do Novo Código de Processo Civil, acarretando uma antinomia jurídica.
Como era de se esperar, logo após a entrada em vigor do CPC de 2015 uma enxurrada de execuções de cotas condominiais surgiu perante a Justiça Paulista e, consequentemente, alguns Magistrados de Primeira Instância passou a indeferir a inclusão na execução as taxas condominiais que se vencerem no curso do processo sob o fundamento de que a execução não reuniria os requisitos de liquidez, certeza e exigibilidade.
Com a interpretação adotada por alguns Magistrados, a consequência imediata seria que a cada nova taxa condominial vencida o credor teria que ingressar mensalmente em juízo com uma nova ação de execução, objetivando cobrar a taxa condominial que fora recentemente inadimplida, de forma que iria abarrotar ainda mais o Poder Judiciário, por conta de excesso de rigor procedimental e, ao nosso ver, uma equivocada interpretação das normas processuais.
Dentro do livro do processo de execução, ao tratar da Execução de Alimentos, o legislador permite que sejam incluídas na mesma execução as verbas alimentares que se vencerem no curso do processo, como se extrai da redação do artigo 911 do NCPC.
Há muito, o Egrégio Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 13 da Seção de Direito Privado II, que dispõe: “Na ação de cobrança de rateio de despesas condominiais, consideram-se incluídas na condenação as parcelas vencidas e não pagas no curso do processo até a satisfação da obrigação. (Art. 290, do C.P.C.).”
Em igual sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.390.324⁄DF e AgRg no AREsp 221.371⁄RJ) formada sob a égide do revogado diploma processual, que fazendo-se uma interpretação histórica se permite seja aplicada às execuções propostas após a vigência do NCPC, eis que fundamentada em artigos que encontram disposições correspondentes no novo CPC.
Pouco a pouco, o Tribunal de Justiça de São Paulo foi instado a firmar seu entendimento sobre a polêmica discussão que passou a crescer.
Em entendimento firmado após a vigência do Novo CPC, a 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em VOTO do ilustre Desembargador Relator EROS PICELI, entendeu pela possibilidade da inclusão das cotas condominiais vincendas na Ação de Execução de taxas condominiais (TJSP, Agravo de Instrumento nº Agravo de Instrumento nº 2122435-83.2016.8.26.0000).
No mesmo sentido, a Colenda 29ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo também manifestou-se favoravelmente à inclusão das taxas condominiais vincendas no curso do Processo na Execução Por Quantia Certa (TJ SP, Agravo de Instrumento nº 2216488-56.2016.8.26.0000).
Portanto, conforme entendimento que já havia sido formado pelo Superior Tribunal de Justiça, sob a égide do CPC/73, aliado ao recentemente entendimento jurisprudencial que vem sendo sedimentado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, é possível a inclusão na Ação de Execução por Quantia Certa de Taxas Condominiais, as taxas condominiais que se vencerem no curso do processo, haja vista que se consubstancia em obrigação de trato sucessivo, encontrando-se fundamento nos artigos 323 e artigo 771, parágrafo único do CPC.
Santo André, SP, 20 de junho de 2018.
Raphael Gonçalves Simcsik, advogado inscrito na OAB/SP nº 346.557, especialista em Direito Imobiliário e Condominial, sócio de Simcsik Sociedade de Advogados, membro da Comissão de Direito Processual Civil da Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Santo André – SP.
[1] “Art. 323. Na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las.”